quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

A família, habitação e drogas.

Foram momentos intensos esses de capacitação profissional! Adoro assistir alguns conceitos firmemente consolidados se encher de dúvidas.
Em um dos dias o tema foi Família...

Inicialmente cada um deveria escrever a palavra que lhe viesse a mente quando se falava em família. Pensei conflito. Mas ouvindo os colegas comentando amor, amizade, proteção, preferi mudar para convivência. Comentei com uma amiga que por sorte me disse: eu tinha pensado em ilusão, mas preferi escrever aprendizado. E assim não destoamos muito da opinião pública.
E então a outra etapa foi fazer um desenho do que nos representa a família, e explicar para todos o porque. Lá estava eu, com meus quatro meses de gestação, olhando uma folha em branco, lembrando de meus pais e tentando identificar algum sentimento passível de ser desenhado. O tempo correndo. "Fiz uma casa por ser o espaço onde se materializa a relação familiar", que ficou meio perdida em meio a tantos corações e elos de corrente. Puxa, já estava me sentindo uma bandida sem coração, sendo tão crítica de uma instituição tão indiscutivelmente amada.
Só que dentro de um CRAS, as famílias atendidas são bastante diferentes de um comercial de margarina. E esse era justamente o pulo do gato. Nosso querido facilitador nos divide em subgrupos, entrega cartolinas e diz, em uma metade desenha a família ideal, na outra a real. O grupo começou discutindo como representar o amor, respeito, confiança, seria um coração com luzinha? E então nossa mestre Yoda, lançou o cutucão: e vocês acham que não precisa de papai, mamãe e filhinho? Se não fosse ela eu provavelmente pensaria "lógico que não" e fim de papo. Uma do grupo defendeu firmemente que não. Dizia ela, dos casos de filhos que são bem tratados por pais viúvos. E perguntei meio assustada: e isso é o ideal?! Que a mãe morra? Passaram a dizer das crianças que são adotadas por gays amorosos. E novamente é esse o ideal? A criança ser afastada dos pais por algum fator bastante negativo para depois entrar num lar harmonioso? Mas então, nesse caso estaria eu defendendo a família tradicional brasileira? Talvez fosse melhor ter ficado nos termos abstratos e indiscutíveis, a família ideal é aquela que fornece proteção, amor, carinho, respeito, diálogo. A Yoda interveio novamente: não digo de gênero, mas com dois adultos fica muito mais leve dividir as responsabilidades e somatizar as alegrias. A outra colega, que não contou com auxilio presencial do companheiro na criação de seus dois filhos confirmou que é muito difícil formar a família sozinha, ter que organizar a casa, cuidar da saúde, alimentação, educação, tomar todas as decisões, etc. Então desenhamos duas silhuetas grandes e uma pequena, envolta por um coração com aberturas para o mundo exterior, com setas de acesso à unidades de saúde, lazer, educação, cultura, esporte, ambiente saudável. Do lado real ficou uma mulher com diversos filhos, sendo uma gestante, casinha de palafita no alto do morro, sem acesso a transporte, educação, saúde, com lixo e esgoto nas ruas, e violência verbal. Um pouco estereotipada, seria como a soma das vulnerabilidades das famílias atendidas.

Acontece que a capacitação continuou e os temas foram mudando e numa certa manhã falou-se de adolescência. E do fato de o Brasil ser um dos países com maior índice de homicídio entre meninos. Isso sendo permitido e incentivado pela guerra contra o tráfico. Aliás essa é a principal ocupação dos casos de trabalho infantil. Isso me deixou incomodada. Não é uma informação inédita, mas sempre incomoda.

Logo em seguida, não sei bem como entramos no tema da habitação. Na Ilhabela os aluguéis são exorbitantes e me revolto toda vez que estou nos cafundéu de uma viela escura e fedorenta, preenchendo um cadastro e a pessoa diz que paga 500/700 reais de aluguel. Isso é quase um salário mínimo!!!

E então me veio uma conclusão óbvia na cabeça.
Seria melhor legalizar e regulamentar a venda de drogas e proibir a cobrança de aluguel para moradia.
Enquanto isso seguiremos enxugando gelo...

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Querer ou não querer o Parque Natural Municipal das Tartarugas?

Eis a pergunta que eu trouxe para casa nessa chuvosa segunda-feira! A convite da amiga e sentindo o peso da responsabilidade da oceanografia e gerenciamento costeiro que pesam sobre meus ombros, tive que comparecer na "devolutiva da consulta pública".

Pegar o bonde andando apesar de incomodo pode ser bem positivo. Devido ao fato de que não estou com o lado tomado. O encontro começou com quase uma hora de atraso, teve uma explicação sucinta das vantagens e maravilhas da criação do parque por parte do secretário e passou para a resposta às questões levantadas na audiência, por um técnico ambiental. Nesse momento não conseguia entender bem porque haveria uma ameaça a cultura tradicional, em especial a pesca. Se fosse só esse o problema, o secretário se adiantou em deixar claro que existe a possibilidade de licenças exclusivas. E a gestão do parque deve ter 50% de seus membros da comunidade civil. Houve a interrupção diversas vezes de um senhor bem exaltado e falador, foi diminuído a "tumultuador, interessado em votos". E eu confusa, sem saber se concordava, afinal o bate-boca atrasa a conversa, torna pesado e cansativo o debate, num leva a nada, vira uma disputa de egos.

Outro ponto defendido na devolutiva foi o da participação, que para o secretário se resume a audiência pública (ou apresentação do estudo técnico e propaganda da proposta) e essa devolutiva como auge, por não ser obrigatória!

Bem, um parque é uma Unidade de Proteção Integral, o que é diferente de uma Área de Uso Sustentável, como uma RESEX (Reserva Extrativista). Pensei que isso poderia ser uma boa resolução para o conflito apresentado, afinal permite o uso dos recursos e é gerida pela comunidade. Fui conversar com o jovem caiçara, primeiro da platéia a ter a palavra. Os argumentos brevemente exposto por ele foram:

-> Já temos leis, em especial o Plano de Gerenciamento Costeiro que se encarregam do manejo da pesca e uso da área marinha. Os quais se adequadamente aplicados dão conta de manutenção da vida marinha, sem a geração de gasto público desnecessário.
->Nessa região não tem exploração ou ameaça às espécies em risco de extinção. E nem há importância ecológica para o ciclo de vida das tartarugas.
->Toda energia e dinheiro gasto nesse plano deveriam ter sido aplicados no tratamento de esgoto há muito tempo atrás, se houvesse uma real preocupação com a vida marinha.
-> Não há estudos que comprovem impactos positivos na criação de unidades de conservação, tanto do ponto de vista ambiental quanto social.

O que me assustou na reunião foi a intensa polarização nós contra eles, pró e contra o parque. Isso torna superficial a discussão, entra num embate de vaidades pela razão e esvazia a discussão. Continuo sem um lado, e penso que algumas questões devem ser priorizadas no tema:

Porque criar um parque?
        Se for pelas tartarugas, esse lugar é de relevância ecológica no seu desenvolvimento?
                                              o parque vai realmente protegê-las, a pesca artesanal é uma ameaça real,                                               maior que o porto, o esgoto, embarcações?