Não, não, não, pensei comigo, esse dia é para lembrarmos que em média 15 mulheres são mortas, a cada dia, pelo simples fato de serem mulheres. Eu em relacionamento sério com um feminista nato e frequentando espaços relativamente civilizados (no bom sentido do termo), não corro risco de fazer parte dessa macabra estatística. Esse dia não é para mim. Foi o que meti na minha cabeça e segui meu dia, como todos os outros. Apenas curtindo algumas postagens feministas.
Mas eis que aos 45 do segundo tempo. Ouço os rapazes de casa
comentando sobre o Game of Thrones, a respeito de uma parte que a mãe diz que "o que o
rei fala vira a verdade e vira a história". Instantaneamente sou arrastada até a
história de Wu Zetian.
Me diga, quantos nomes de rua femininos vc conhece? Quantos
bustos femininos vemos expostos pelas praças? Nomes de cidade? Não que isso
signifique lá muita coisa, ainda mais no Brasil que escolhem a dedo os nomes e
rostos para serem homenageados, e os verdadeiros heróis são sistematicamente
ignorados. De todo modo, quantas
filósofas vc leu, ou ouviu falar? Quantas cientistas? Deusas? Líderes
políticos? Mestres iluminadas? Revolucionárias simbólicas? Será que não houve? Será que só hoje as mulheres
são capazes e tem permissão de ousarem e agirem, e contribuírem para o
progresso moral, intelectual e social da humanidade? E espiritual? Não houveram
personalidades femininas dignas de serem lembradas? Porque tanto se fala de
Sócrates e tão pouco de Aspásia? Será que não houveram mulheres notáveis, ou
será que foram sendo pouco a pouco removida dos livros de história? Tão pouco os que leram Rosa Luxemburgo, ou Ema Goldman!
Voltemos a nossa Wu. Citada no maravilhosos livro: Feminino
Ativo, Feminino Solar. Wu é apresentada na história chinesa como um ser
diabólico de tão sanguinário. Bem, de fato, muito sangue foi derramado sob suas
ordens, passível de crítica, no entanto, não teria ela derramado mais sangue do
que outros imperadores a ponto de justificar tal fama. Pq sua história e contada com esse enfoque?
De início partimos que mesmo hoje, com certa liberdade que
gozam os historiadores, havemos de convir que a história contada é bastante
parcial. Na China essa parcialidade é acentuada, e os escritores relatam o que
lhes é ordenado dizer, ou então não dirão nada.
Wu cometeu uma primeira grande gafe ao nascer sem um
salsichão pendurado entre suas pernas. Mesmo num tempo de alguma valorização do
feminino, mulheres eram consideradas pessoas de polaridade yin, passivas e
submissas, naturalmente, sem capacidade física ou moral de reinar. Confrontar
essa “lei natural” determinista de modo prático a transformava, para muitos, em
um monstro antinatural.
Segundo, e possivelmente mais importante. Wu traz reformas
profundamente democráticas. Instaurou sistemas de concurso público para altos
cargos do Estado, “projetou diversas medidas humanitárias, tais como diminuição
dos impostos, para favorecer o desenvolvimento da agricultura e da indústria da
seda; isentar de trabalhos forçados os habitantes de algumas zonas e, de modo
geral, reduzi-los um pouco em toda parte; converter a atividade militar em
educação moral; limitar os excessos de luxo; promover o taoísmo; revalorizar o
papel de mãe e e o respeito que lhe é devido [...]” Conquistando assim o apoio
incondicional do povo e o ódio da classe aristocrática. A qual após sua morte se dedicou a destruir
sua história para não haver risco de que semelhante ameaça voltasse a lhes
acontecer.
Ainda hoje exercer o papel de liderança num corpo feminino é um desafio bastante grande:
"Em uma experiência comum, feita em vários países, um grupo de pessoas é convidado a avaliar um discurso feito por um homem, enquanto outros avaliam o mesmo discurso feito por uma mulher. Geralmente, todos dão uma nota maior quando o discurso é feito por um homem.
A autopromoção é uma estratégia útil para os homens, mas quando as mulheres ressaltam suas próprias realizações, provocam antagonismos ou não despertam interesse. E as mulheres parecem ficar ainda mais ofendidas com a autopromoção feminina do que os homens. Isso cria um enorme desafio para mulheres porque, quando ela é uma pessoa modesta, é considerada medíocre. Se ela procura promover suas realizações, porém, é taxada de presunçosa. Para o azar das mulheres, a liderança feminina pode ser reconhecida pela competência ou pela simpatia, mas não por ambas." (Link)
"Em uma experiência comum, feita em vários países, um grupo de pessoas é convidado a avaliar um discurso feito por um homem, enquanto outros avaliam o mesmo discurso feito por uma mulher. Geralmente, todos dão uma nota maior quando o discurso é feito por um homem.
A autopromoção é uma estratégia útil para os homens, mas quando as mulheres ressaltam suas próprias realizações, provocam antagonismos ou não despertam interesse. E as mulheres parecem ficar ainda mais ofendidas com a autopromoção feminina do que os homens. Isso cria um enorme desafio para mulheres porque, quando ela é uma pessoa modesta, é considerada medíocre. Se ela procura promover suas realizações, porém, é taxada de presunçosa. Para o azar das mulheres, a liderança feminina pode ser reconhecida pela competência ou pela simpatia, mas não por ambas." (Link)
Feminino Ativo |
“com elas, não há conflitos, tudo é mais tranquilo [...] o
elemento masculino é causador de problemas quando possui algo sujeito a rivalidade
[...] os homens [mosos] não possuem nada [portanto] eles não tem nenhum motivo
para brigar.”
Esse livro traz diversos exemplos de mulheres e sociedades
que nos convencem de uma vez por todas que essa história de feminino estar
relacionado a passividade e submissão é uma grandiosíssima mentira. Períodos em que o feminino era respeitado e valorizado apresentam verdadeiros momentos de progresso e avanços tecnológicos e morais. O mais
interessante é analisar como esse conceito (feminino = passivo, submisso, inútil, servil) é construído de modo maquiavélico,
ninguém nunca me disse, não que eu me lembre, claramente “cala boca que vc é
mulher e só fala asneira”. Hum, lembrando melhor talvez meu irmão tenha me dito
algumas vezes, mas era “zoeira”, assim como, tenho me lembrado, algumas piadas
e correntes de e-mail. Mas o fato alarmante é que essas infelizes piadas foram endossadas pelas aulas de
história, matemática e física, ao sempre endeusarem cérebros masculinos (brancos
de origem europeia, diga-se de passagem, classe alta, provavelmente uma vez que
educação é seletiva), idem na religião “pai, filho, espírito santo” (em muitas
crenças silenciadas essa trindade é feminina, ou composta por casal e filhx,
mesmo pq se Deus está associado à criação quem está mais próximo desse dom, o
feminino ou o masculino?) ou Kardec, Buda, Islamismo... Eu, de um modo ou outro, sempre soube que mulheres são seres inferiores,
eu tentava achar algo que me provasse o contrário, mas na realidade eu sabia
que éramos. Tempos difíceis esses...
Agora eu sei que não somos inferiores. Esse livro está sendo uma luz muito
importante nessa consolidação desse meu novo saber. Eu sempre encarei a
menstruação como um castigo, como algo realmente degradante, vergonhoso,
monstruoso, uma moléstia. Mas sabe, ter essa ligação tão forte com um belo astro redondo e majestoso,
é uma linda relação com a natureza. A capacidade de dar a luz, gerar vida é
muito mais ativo do que a passividade de ser um receptáculo ao líquido da vida
masculino, conceito inculcado a muito que ainda hoje tem repercussão quando não
cabe a mãe decidir que tipo de parto ela escolhe ou se quer parir.
Não minhas amigas. Não somos passivas, e não devemos, em
hipótese alguma, nenhum tipo de submissão, isso é contrário a nossa natureza, e
só há de trazer dor, sofrimento e infelicidade. Obviamente, não é a autoridade
e tirania, por outro lado que nos darão a paz de espirito oriunda da
felicidade. Mas, o respeito mútuo às liberdades e escolhas.
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